O que sustenta um projeto artesanal? – segunda jornada

segunda jornada – expandir e fazer junto

Na primeira jornada em torno das questões sobre a “sustentabilidade” dos projetos artesanais, lembramos a força dos verbos acreditar e agir, com continuidade e resiliência. Mostramos como nossa defesa pelo feito à mão nos orienta ao caminho da sustentabilidade dos projetos artesanais por meio das relações entre as pessoas e entre os fazeres, que valorizam a singularidade e a coletividade. No itinerário desta segunda jornada, percebemos o convite à expansão, à participação e ao engajamento de outros. Este texto é um resumo da segunda jornada vivida a partir da Revolução Artesanal – “a partir de” e não “por” ou “na”, pois o movimento de expansão é pulso que acontece desde dentro até onde puder alcançar.

Desde 2016, a Revolução Artesanal fomenta e realiza anualmente o Festival do Fazer, o evento que valoriza e privilegia os processos (internos, externos e no tempo) dos fazeres manuais e as histórias dos artesãos. Este ano o Festival foi realizado ao longo de dois dias inteiros na Unibes Cultural, espaço amplo que abriu possibilidade de uma vivência potente em torno de fazeres manuais ao mesmo tempo que ampliou os desafios, inclusive financeiros, para sua viabilização. Com a expansão, era chegada a hora de convocar mais mãos a fazer junto o Festival: abrimos as portas para parcerias verdadeiras alinhadas com a cultura do fazer manual e fizemos nossa primeira experiência com financiamento coletivo no Catarse.

Realizamos parcerias com artesãos dos mais diversos fazeres: curadoria de cultura, fotografia, desaceleradores, gestão de resíduos, design, arquitetura, educação, escrita afetiva… que contribuíram de variadas formas com seu saber, suas conexões com outros artesãos e com muita mão na massa para que o Festival pudesse acontecer! Parceiros e articuladores acreditaram e fizeram este Festival junto conosco.

Nesta edição, pela primeira vez em nossa história, lançamos o chamado de apoio para o mundo, por meio do financiamento coletivo para viabilizar a produção e execução do Festival. Nossa meta: R$ 25.900,00; a modalidade: ou tudo, ou nada – ou seja, ou atingíamos essa meta para usufruir do valor ou todo o dinheiro arrecadado seria devolvido aos benfeitores. O prazo: um mês. Faltando um mês para o evento, já em meio aos preparativos para o evento, o Festival do Fazer 2019 ganhou uma nova camada de ansiedade com nossa meta “ou tudo, ou nada”.

Nesse mês de maio, muitas mãos já articulavam o festival, conectavam e divulgavam o evento, desenhavam como os espaços seriam ocupados e que história contariam, costuravam, cortavam, pintavam elementos que decorariam e sinalizariam o evento, colavam e descolavam os post-its do plano vivo do festival que se fazia. Um mundo sendo criado a muitas mãos foi nascendo antes do evento. Ao mesmo tempo, mãos conhecidas e desconhecidas apoiavam financeiramente o projeto: R$ 7 mil na primeira semana! Na penúltima semana, a conquista de 51% da meta era motivo de celebração e tensão – a divulgação e os contatos foram intensificados; faltando 2 dias para encerrar a campanha, restavam apenas 9% para bater a meta – a tensão moveu afetos no grupo de artesãos envolvidos no festival, que se manifestaram sobre unir forças para bater a meta se fosse necessário. No último dia da campanha, a boa notícia: contamos com 150 mãos generosas que acreditaram que o mundo feito à mão é uma realidade e contribuíram com doação no financiamento coletivo.

Quando expandimos o que nos move a realizar o Festival e expusemos o que era necessário para viabilizá-lo, iniciamos um pulso de atração de pessoas que nos deram as mãos para torná-lo real no mundo. Mãos que articularam pessoas e fazeres, que escreveram, que se conectaram, que teceram, que pintaram, que fotografaram, que doaram, que cozinharam, que montaram/desmontaram… Mãos que possibilitaram esta expansão consciente e congruente do Festival, fazendo junto, co-fazendo.

Expandir e fazer junto é a segunda jornada de sustentabilidade de projetos artesanais – sonhar grande e somar pessoas que acreditem junto. A segunda jornada fala sobre a sustentabilidade das relações e da confiança na inteligência coletiva. Ela fala também sobre a sustentabilidade financeira aliada a fornecedores conectados com o acreditar e o agir da primeira jornada. Ou seja, trata da qualidade desse apoio financeiro. A terceira jornada de sustentabilidade de projetos artesanais é sobre a nossa relação com o mundo, com os recursos que utilizamos e descartamos e com a ecologia do nosso fazer artesanal. Esperamos por você na jornada do próximo texto!

Escrita artesanal por Carolina Messias com Ciça Costa e Bruno Andreoni.

 

ARTESANAL - MANIFESTO

As mãos como ponte dos afetos de dentro para fora
dão forma ao pensamento, à singular expressão.

O artesanal mobiliza o que há de mais humano em nós:
imaginar, criar e fazer,
dar sentido às emoções, memórias, relações,
dar formas, cores, sabores, funções,
dar movimento e beleza.

Nosso ativismo artesanal acontece no “fazendo”:
no olhar sobre e para o mundo,
na escolha de como consumimos e ocupamos o mundo,
na valorização do pequeno, do local e do autoral,
no manejo do corpo com as ferramentas e os materiais,
no aprendizado com o erro, a repetição e o tempo do fazer,
no contato com a natureza e nossas raízes artesãs.

É no “fazendo” que nos colocamos
corajosamente em atrito com o nosso fazer;
é no “fazendo” que transformamos
as coisas, a nós mesmos e o mundo para,
aos poucos,
reacender a sabedoria que está dentro de nós,
de cada um de nós,
de nossa ancestralidade e
do que queremos criar com sentido neste mundo.

Por um mundo feito à mão, um mundo feito por nós!